domingo, 29 de junho de 2014

Guido d'Arezzo e as Claves


Guido d'Arezzo

Na obra de Guido d'Arezzo (c.991/92-após 1033), de cerca de 1030, as linhas estão uma terceira de distância, e por isso as notas puderam ser escritas "entre" linhas bem como "nas" linhas. Guido recomendou que se pintasse à escolha uma dada linha e que se lhe atribuísse uma altura específica. Sugeriu que o fá fosse vermelho e em alternativa o dó amarelo. Propôs também que a designação da nota fosse escrita à frente de pelo menos uma das linhas assinalando a sua altura.

Foi assim que nasceu o sistema de claves.

Por fim, vale a pena relembrar que ao longo deste período, os intérpretes seguiam uma notação que não tinha barra de compasso e era bem diferente da notação moderna. Hoje, alguns especialistas repescaram esta prática e chegaram à conclusão  de que liberta a música e lhes permite  perceber a "retórica" subjacente ao ritmo ou direcção dos ritmos de discurso.



Exemplo da sugestão de Guido d'Arezzo



sexta-feira, 20 de junho de 2014

Unlived Memories - Oscar Wilde e Chopin


"After playing Chopin, I feel as if I had been weeping over sins that I had never committed, and mourning over tragedies that were not my own. Music always seems to me to produce that effect. It creates for one a past of which one has been ignorant, and fills one with a sense of sorrows that had been hidden from one's tears. I can fancy a man who had led a perfectly commonplace life, hearing by chance some curious piece of music, and suddenly discovering that his soul, without his being conscious of it, had passed through terrible experiences, and known fearful joys, or wild romantic loves, or great renunciations".
 — Oscar Wilde, "The Critic as Artist"

 Wilde não tocava piano; ele está a falar aqui através do carácter dialógico de Gilbert. Quando isso acontece, o irmão de Wilde, Willie, tinha alguma habilidade como pianista, e gostava muito de Chopin. O compositor Ethel Smyth relata, no seu livro de memórias "Impressions"  o mais fascinante que permaneceu é que Willie não só tocava os Estudos de Chopin como inventou novas terminações para eles. O que estes possam ter soado como é uma incógnita.
Ainda mais estranho é o facto de que Willie propôs casamento a Smyth-imediatamente após ela se ter violentamente enjoado durante uma viagem através do Canal da Irlanda. Smyth entretido, a noção por algumas semanas, então recusou. Foi o melhor: Smyth era lésbica, Willie era um alcoólatra.



sábado, 7 de junho de 2014

Tchaikovsky: Um Compositor Precoce




Foto do compositor
Piotr Ilich Tchaikovsky, um dos compositores russos mais importantes do século XIX, nasceu a 7 de maio de 1840 em Votkinsk, um centro mineiro e industrial situado a este de Moscovo. Seu pai, Ilya Petrovich, engenheiro da Escola de Minas, dirigia nesse local uma importante exploração. Embora as suas terras e títulos se tivessem perdido há várias gerações e o seu cargo lhe trouxesse mais prestígio do que dinheiro, Ilya Petrovich vivia como um grande latifundiário: numa casa imponente e com criados. O governo tinha, inclusivamente, colocado às suas ordens um grupo de cossacos, para o caso de o espírito dezembrista reencarnar nos mineiros ou nos servos.
Família de Tchaikovsky
Em 1833, Ilya Petrovich, que tinha enviuvado, casou com Alexandra Andreievna d'Assier, uma aristocrata de origem francesa, bela, culta e refinada. Dessa união nasceram seis filhos: Nikolay, Piotr Ilich, Alexandra, Ippolit, Modest e Anatol. O futuro compositor, segundo este grupo, chamava aos irmãos, respectivamente, Kolia, Sasha, Polia, Modia e Tolia, como era habitual na Rússia. Fanny Durbach, uma jovem precetora suíça, deu-lhes as primeiras aulas.
O Compositor em Criança
Com apenas quatro anos e meio, o pequeno Piotr, a quem os irmãos chamavam Petia, insistiu em ter aulas. Para espanto de todos, o pequeno Petia não só tocava maravilhosamente piano - instrumento que se tinha tornado símbolo de sensibilidade e cultura nos lares oitocentistas -, como também compunha. "Comecei a realizar as minhas próprias criações quando soube o que era a Música", confessaria o artista anos mais tarde. O menino até sabia passar para piano as árias de Ópera Italiana que os mais velhos ouviam do "orquestrião", um órgão mecânico accionado por uma manivela.

Era, sem dúvida, um génio precoce.


sexta-feira, 6 de junho de 2014

Rachmaninov: Um olhar sobre a Saúde


Foto de Sergei Rachmaninov

Uma Verdade Inconveniente

Em 1943, o pianista russo virtuoso, compositor e maestro Sergei Vasilievich Rachmaninov (1873-1943) ficou doente no meio de uma tour e foi internado num hospital em Los Angeles. Quando o cancro foi diagnosticado, ele olhou para as mãos e sussurrou: "Minhas queridas mãos ... Adeus, minhas pobres mãos"

Rachmaninov é talvez melhor conhecido pelo seu segundo concerto em Dó menor, popularizado no filme Brief Encounter (1945) e O Pecado Mora ao Lado (1955); o sostenuto adagio forneceu a inspiração em 1976 para a  canção pop de Eric Carmen "All By Myself", posteriormente re-intrepretado por Celine Dion. O concerto nº3 em Ré menor, já popular, foi dada maior exposição por David Helfgott, na enredo do filme Shine (1996).

Mãos do pianista e Compositor
Mãos Enormes


O tamanho das suas mãos podem ter sido uma manifestação da síndrome de Marfan, o seu tamanho e magreza típico de aracnídeo. No entanto, Rachmaninov não exibem claramente nenhuma das outras características clínicas típicas da síndrome de Marfan, como escoliose ou complicações cardíacas. Não há nenhuma indicação de que sua família imediata teve parentes semelhantes, descartando doença hereditária.


A acromegalia é um diagnóstico alternativo.
De fotografias de Rachmaninov nos anos 1920 e seu retrato por Konstantin Somov em 1925, no momento em que ele estava a gravar o seu quarto concerto para piano, as características faciais grosseiras da acromegalia não são imediatamente aparentes.

Depressão

Crises repetidas de depressão também são consistentes. Em 27 de março de 1897, a sua Primeira Sinfonia foi mal recebida numa performance conduzida por um embriagado maestro Aleksandr Glazunov. Este evento, a partir do qual Rachmaninov fugiu horrorizado, poderá ter dispoletado o seu primeiro grande episódio de depressão, o que trouxe temporariamente o impasse à sua carreira."Todas as minhas esperanças, toda a crença em mim mesmo, tinham sido destruídas". Apenas no segundo semestre de 1900 voltou para a composição, com a ajuda de um hipnotizador, o Dr. Nikolai Dahl, a quem dedicou o seu segundo concerto para piano, o segundo e terceiro movimentos dos quais brilhantemente executou em dezembro daquele ano. Seu segundo grande surto de depressão começou durante a Segunda Guerra Mundial, quando morava perto de Los Angeles, provavelmente relacionado com as preocupações sobre a segurança de uma de suas filhas e tristeza pela morte de parentes e amigos na guerra.

O Inicio do Fim

Durante uma agenda de concertos pesado na Rússia em 1912, ele interrompeu a sua programação por causa da rigidez nas mãos. Isto pode ter sido devido ao uso excessivo. Em 1942, Rachmaninov fez uma revisão final do seu quarto Concerto.

 O melanoma (cancro na pele) progrediu rapidamente e obrigou-o a interromper a sua tour 1942-1943 depois de um recital em Knoxville, Tennessee.

Pouco mais de cinco semanas depois, ele morreu na casa que ele havia comprado no ano anterior em Elm Drive, em Beverly Hills.

quinta-feira, 5 de junho de 2014

F. Chopin: O Estilo Pianístico




O Estilo Pianístico

No primeiro terço do século XIX, existiam basicamente dois tipos de piano: o inglês e o vienense. Um terceiro modelo, o "Erard", inventado em 1821, permitia repetir trilos e notas de velocidade mais acentuada. Segundo Liszt, Chopin preferia os pianos Pleyel, baseados no modelo vienense, "devido à sua sonoridade argêntea e um tanto ou quanto velada, bem como ao toque fácil".
Em segundo lugar, optava pelos Erard, embora, em 1848, durante os seus concertos na Grã-Bretanha, tenha utilizado sem dificuldade ,o Broadwood. A facilidade com que utilizava os diferentes tipos de mecanismos foi decisiva para a aproximação dos diferentes modelos.

A 10 de julho de 1848, o jornal inglês Daily news realçava: "Chopin executa passagens incrivelmente difíceis, mas de modo tão calmo e suave e com uma delicadeza tal que o ouvinte não concebe a sua verdadeira magnitude. A redondeza perlé das suas passagens de articulação rápida constituem os traços característicos da sua execução". Com efeito, a textura fundamental da música de Chopin consiste na melodia acompanhada por numerosas variações que aproveitam todo o potencial dos recursos do piano. Há ocasiões em que a melodia é harmonizada através de simples acordes; há outras em que o acompanhamento tem o ritmo de dança, mas com infinitas e subtis variações. A textura dos Nocturnos isola uma melodia na mão direita, enquanto a mão esquerda, auxiliada pelo pedal, produz o fundo rítmico  e harmonioso mediante acompanhamento de acordes quebrados, cuja junção é feita intuitivamente pelo ouvinte. Em todos os casos, a melodia alicerça-se em poucas notas e pode ser executada com bastante expressividade.

Nas palavras do escritor francês André Gide nas suas Notas sobre Chopin, " Todos os nocturnos de Chopin criam uma atmosfera singular, esboçam uma imagem do sentimento e, de imediato, extinguem-se como o voo de um pássaro ao pousar..."


Pianos por ordem do texto:


 Piano Estilo Inglês do séc XIX

Piano Estilo Vienense do séc XIX

Piano "Erard" do séc XIX
Piano "Pleyel" do séc XIX


quarta-feira, 4 de junho de 2014

Neumas: A notação Gregoriana







Princípios

A notação gregoriana foi primáriamente projectada para transpôr para papel os cantos sagrados  do ínicio do segundo milénio.
A escala usada é, em notas modernas: Dó, Ré, Mi, Fá, Sol, Lá. Os intervalos entre estas notas são os mesmos da notação moderna.
As notas são escritas numa pauta de 4 linhas. Cada pauta corresponde a um único cantor, portanto não há acordes neste tipo de pautas (um ser humano normal teria dificuldade em cantar várias notas ao mesmo tempo !)
Só está escrita a altura das notas, o mestre de côro (ou cantor) é livre de escolher a duração. No entanto, nalguns casos, a indicação de notas mais longas ou mais curtas poderá ser fornecida.
As posições onde o cantor pode respirar (pausas) também são escritas.
Isto é equivalente às pausas da notação moderna.
Porque estamos a falar de cânticos, as letras são quase sempre associadas com a pauta.
A cada palavra (ou sílaba) da letra corresponde uma ou várias notas (até 4).
Todas as notas cantadas na mesma palavra ou sílaba são agrupadas numa entidade chamada de Neuma.

Neumas

O neuma é a base da notação gregoriana.
Um neuma é definido por :
  • as notas que compõem o neuma (de uma a quatro)
  • os intervalos entre estas notas (para cima ou para baixo)

  •  
Cada neuma tem um nome diferente. As notas que compõem o neuma são desenhadas como um ponto quadrado, um rombo (diamante) ou uma linha realçada.
Um neuma começa sempre no ínicio de uma sílaba.
Um neuma é sempre lido da esquerda para a direita (como na notação moderna) mas debaixo para cima quando as notas são escritas na mesma coluna.
Por exemplo :
Aqui pode ver três notas escritas em notação moderna. A altura é incrementada da primeira para a segunda, e incrementada novamente da segunda para a terceira.
É o neuma “Scandicus”, escrito como em baixo na notação gregoriana :
Podem ser escritas no mesmo neuma de 1 a 4 notas. Portanto podem existir até 3 alterações de altura (inflexões) num único neuma.
Existem então 1+2+4+8, ou seja 15 neumas diferentes. Cada qual com um nome próprio.
 



Número
de notas
InflexõesNome do Neuma
1NenhumaPunctum (notas simples) ou Virga (nota com haste)
2Aumentada (A)Podatus (pes)
2Baixada (B)Clivis (flexa)
3UUScandicus
3UDTorculus
3DUPorrectus
3DDClimacus
4UUUVirga praetripuncits
4UUDScandus flexus
4UDUTorculus resipunus
4UDDPes subtripunctis
4DUUPorrectus resupinus
4DUDPorrectus flexus
4DDUClimacus resupinus
4DDDVirga subtripunctis
Fonte: http://www.myriad-online.com/resources/docs/melody/portugues/gregorien.htm

segunda-feira, 2 de junho de 2014

L. V. Beethoven a Surdez e Depressão

Todos sabem que Ludwig  van Beethoven ficou surdo. Talvez, além das famosíssimas composições (muitas delas compostas após a surdez), ele seja mais conhecido por ser ‘aquele compositor que ficou surdo’. A visão que quero tratar neste post é toda a enxurrada de sentimentos e angústia do alemão em relação à sua surdez. Aliás, como poderia alguém que vive de música sofrer de surdez logo aos 26 anos? Bom, a seguir, o que você provavelmente não sabia sobre a surdez de Beethoven.
SIMPATIAS E MÉTODOS ABSURDOS
Tentativas de cura foi o que não faltou na triste jornada do músico. Visitou vários médicos e tentou das mais estranhas técnicas de recuperação da audição e de diminuição da dor (para quem não sabe, a sua condição era acompanhada de grandes dores e estalos nos ouvidos). A grande maioria, porém, fizeram foi piorar o estado da audição. Eram métodos totalmente empíricos e mal executados. Alguns deles:
- retonificação com óleo de Mandorle
- banhos frios e banhos quentes
- banhos rápidos no rio Danúbio
- torniquete no braço
- saunas
- estimulações elétricas de corrente contínua
PARANÓIA

Beethoven era uma figura pública, reconhecido por suas obras. Como tal, então, ele tinha amigos mas também inimigos. E mais, tinha uma reputação a zelar, e temia que a surdez progressiva pudesse afectá-la. Pelas suas cartas e depoimentos de amigos, o músico alemão tinha uma preocupação fora do normal (mas compreensível) com o pensariam dele por ser surdo. E junto com a paranóia vinha a vergonha de perder capacidades que para ele eram completamente naturais, como perceber sons a longas distâncias ou certos instrumentos na orquestra.
“E se os meus inimigos vierem a saber? O que falarão por aí? Para te dar uma ideia desta estranha surdez, no teatro eu tenho que me colocar pertíssimo da orquestra para entender as palavras dos atores e a uma certa distância não consigo ouvir os sons agudos dos instrumentos e do canto. Surpreendentemente, nas conversas com as pessoas muitos não notaram minha surdez, acreditam que eu sou distraído (…) Tive que viver sozinho e se estou com alguém fico com uma enorme ansiedade do medo de correr o risco de se notar a minha condição. Provei desta humilhação quando um aluno que estava ao meu lado ouvia o som de uma flauta e eu não, ouvia o canto de um pastor e eu nada”. Cartas de Beethoven quando tinha 31 anos.
SOLIDÃO
É obvio que alguém que é surdo estará de alguma forma alheio ao mundo ou convívio social, ou seja, experimentará um pouco da solidão. O que dizer então de alguém que desde os 8 anos se relaciona com músicos e construiu toda sua vida em um meio musical e com pessoas relacionadas à área? O resultado é falta de assunto, falta de contato e, como citado acima, vergonha de se relacionar. E para piorar o caso de Beethoven, ele teve que se mudar para o campo (local afastado) quando ele se declarava amante de cidades.
“Há quase 2 anos me afastei de todas as atividades sociais, principalmente porque me é impossível dizer para as pessoas : Sou surdo! (…) Para meus amigos e para aqueles que pensavam que eu era anti-social, distraído e ermitão, me julgaram mal. Vocês não conheceram a causa secreta disso tudo. (…) Nascido com um temperamento ardente e ativo e sensível às atrações da sociedade, tive que bem cedo me isolar e transcorrer a vida em solidão.” Cartas de Beethoven.
DEPRESSÃO
A depressão é o resultado inevitável dos dois itens anteriores. O descontentamento dele é como uma poesia byroniana, onde quase escolheu a morte em algumas ocasiões. Convenhamos, deve ser insuportável ir perdendo aos poucos a única coisa que o interessava: a música. Felizmente, foi exatamente a música que o fez mudar de ideia várias vezes.


“Quase coloquei fim à minha vida algumas vezes. Foi a música que me entreteve. Me parecia impossível abandonar este mundo antes de criar todas as óperas que sentia imperiosa necessidade de compor. Esta foi minha vida, angustiosa.” Cartas de Beethoven.

Beethoven morreu aos 56 anos em Viena, na Áustria, e teve um grande velório. Mas maior ainda foi a sua contribuição para a música.